Crítica de cinema: “Ground Zero” — Um olhar equilibrado sobre a realidade do conflito na Caxemira
O novo filme “Ground Zero”, protagonizado por Emraan Hashmi, mergulha no complexo universo do conflito na Caxemira sem cair no patrioteirismo excessivo que tantas vezes caracteriza este tipo de narrativa. Baseado em eventos reais, o drama oferece uma visão mais humana e ponderada da atuação das forças de segurança numa das regiões mais conturbadas da Índia.
A história gira em torno de uma operação intensa de busca e captura em Srinagar, que culmina na neutralização de um temido terrorista. Embora este enredo possa soar familiar, “Ground Zero” distingue-se ao estrear na mesma semana da tragédia de Pahalgam, um episódio que ainda ecoa na memória coletiva. Além disso, o filme opta por evitar discursos nacionalistas inflamados, focando-se antes nos desafios enfrentados pelos agentes da Força de Segurança de Fronteira (BSF) e de outras forças no terreno.
Emraan Hashmi interpreta o oficial Narendra Nath Dhar Dubey, responsável pela localização e eliminação do líder terrorista Ghazi Baba e seus cúmplices em 2003 — ano em que o então primeiro-ministro Atal Bihari Vajpayee visitou a Caxemira, num período de crescente tensão. O filme recupera até mesmo imagens do ataque ao Parlamento de 2001, reforçando o clima de ameaça constante.
No enredo, os agentes de inteligência baseados em Deli — interpretados por Rahul Vora e Zoya Hussain — demonstram resistência à liderança de Dubey, que questiona os relatórios oficiais e segue a sua própria intuição. Também o seu superior direto (Mukesh Tiwari) mostra-se cético, mas Dubey mantém-se firme, confiando tanto nos colegas como no seu instinto.
Sem revelar detalhes inéditos — uma vez que os factos são documentados — o filme pinta um retrato nuançado da região, onde os habitantes locais oscilam entre a cumplicidade e a inocência, conforme as circunstâncias. “Esta terra é nossa, mas será que o povo daqui também o é?”, questiona Dubey numa das cenas mais marcantes. A resposta do seu colega ferido (Deepak Paramesh) é clara: “Sim, são.”
A tensão crescente é construída com precisão: sair para o mercado, mesmo acompanhado de colegas armados, pode ser um risco de vida. Este retrato da realidade caxemiresa, onde jovens como Hussain (interpretado por Mehroos) são facilmente aliciados por grupos extremistas, confere autenticidade à narrativa.
No entanto, nem tudo é equilibrado. Em algumas sequências, especialmente quando a equipa de Deli entra em cena para ditar regras aos agentes locais, o filme perde ritmo. A atuação de Zoya Hussain como agente disposta a escutar Dubey é convincente, mas tanto Vora como Tiwari oscilam entre a agressividade e o exagero. Já Sai Tamhankar, no papel da esposa de Dubey, destaca-se num momento comovente ao defender o marido, evidenciando também como o peso da missão afeta a vida doméstica.
“Ground Zero” não oferece respostas simples nem finais felizes idealizados. O que entrega é uma reflexão necessária sobre o impacto da violência e da luta contra o terrorismo numa terra onde todos, civis e militares, enfrentam dilemas morais e sobrevivem entre escolhas difíceis. Num tempo em que o equilíbrio é raro, o filme destaca-se como uma abordagem sensata e profundamente humana.